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Para driblar o alto custo, Günter faz "dieta" com seu rebanho. Perde na quantidade, mas ganha no processo (Foto: Lidiane Mallmann)

Preço do leite muito baixo força produtor a economizar no campo

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Günter Kuhn (51) fracionou a ração de suas vacas na localidade de Arroio Grande Superior, no interior de Arroio do Meio. A medida foi tomada para conter o custo da produção de leite que disparou com aumento da eletricidade, combustíveis, adubos e rações utilizadas no rebanho.

Um balanço divulgado pelo Conselho Paritário do Leite (Conseleite) aponta que em 2015 o preço pago pelo leite ao produtor recuou. Em valores corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o preço do litro do leite referência caiu 8,5% no último ano. O valor médio comercializado no Estado foi de R$ 0,8492, quando em 2014, o litro era negociado a R$ 0,9286.

Günter sabe bem disso. Na propriedade, ele tomou uma medida radical. Cortou parte da ração oferecida às vacas. Com menos comida, a produção também caiu. “Mas é melhor reduzir o volume de leite do que aumentar a ração e elevar ainda mais os custos. A crise está grande e as dificuldades também.”

Com um rebanho de 20 vacas em lactação, o produtor de Arroio do Meio ordenha por dia 350 litros de leite. O produto é captado por uma multinacional que a cada dois dias vai até a propriedade e recolhe o leite. “Pelo menos está pagando em dia. Nós temos mais de R$ 13 mil empenhados em dívidas com empresas que já fecharam.”

Além da ração das vacas, o produtor suspendeu investimentos da propriedade. A ordenha mecânica poderia receber dispositivos eletrônicos para contabilizar com maior precisão a produção de leite da família. Mas por enquanto não vai. Günter nem sabe quando poderá investir em tecnologia, cada vez mais necessária ao agronegócio.

Cenário futuro

O medo é criar mais dívidas. É ter que vender suas vacas e ter que ir trabalhar na cidade. Do leite de Arroio Grande Superior vivem seis pessoas. Os pais de Günter estão entre elas. Os idosos não trabalham mais no campo, mas acompanham o trabalho do filho, que está desanimado com a projeção para 2016.

“Nem o clima coopera. Está chovendo demais, desde o início da primavera. Essa condição prejudica as pastagens, prejudica a plantação de milho. São todas culturas aqui da nossa propriedade, usadas na alimentação do rebanho.” O produtor vê mais um ano sombrio para o mercado do leite.

Comparação

De acordo com o relatório do Conseleite, comparando o desempenho de 2015 com 2013, o rombo nas contas do produtor é ainda maior. Há dois anos, um litro de leite valia R$ 0,9837 na média. Em algumas propriedades como a de Günter, o produto era comprado por R$ 1,04.

Considerando o valor médio pago em 2015, o preço que a família de Arroio do Meio vendia seu leite em 2013, a variação negativa é de 22,46%.

No mês de dezembro deste ano, o Conseleite projeta mais uma queda de 1,33 pontos percentuais no preço do leite. O preço de referência estimado para o leite padrão é de R$ 0,8405 frente ao consolidado de novembro, que ficou em R$ 0,8519.

Para o presidente do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Estado do Rio Grande do Sul (Sindilat), Alexandre Guerra, os números apontados pelo conselho estadual mostram a tradicional redução de preços que ocorre a cada fim de ano. “É quando o comércio está mais focado em comprar produtos festivos.”

Já a indústria por sua vez, também tem sua versão. Assim como na ponta de lança onde está o produtor, o custo operacional dentro das fábricas de laticínio aumentou. Essa situação faz com que, de acordo com o Sindilat, o valor pago ao produtor não ultrapasse a margem fixada, em razão do baixo consumo do verão associado ao valor elevado na produção industrial gaúcha.

“O ano foi uma catástrofe para o leite”

A partir do relatório apurado pelo Conseleite, o presidente da regional dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais (STR) do Vale do Taquari, Luciano Carminatti (45), o ano que passou foi desastroso para a produção. “2015 foi uma verdadeira catástrofe para a produção de leite no Estado.”

Carminatti compara os preços com uma década de distância. De acordo com ele, em 2005, o preço médio do litro pago era R$ 0,60. Aplicando a correção da inflação em dez anos, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o valor do litro do leite corrigido pelo IPCA deveria ser comercializado a R$ 1,09.

Para o técnico agrícola da Emater/RS-Ascar de Paverama, Aldoci Pretto (52), os pequenos produtores sofrem mais com os baixos preços. Na cidade, segundo ele, muitas famílias que produziam em baixa escala – menos de cem litros de leite por dia -, desistiram do negócio. “O que está acontecendo é que a produção se concentra cada vez mais na mão de grandes produtores.”

Pretto explica que com menos gente produzindo leite, maior pode ser o valor pago nos anos seguintes. A opinião é compartilhada por Carminatti. Para ele, o “Feliz Ano-Novo” marcará a reconstrução de uma imagem positiva da produção de leite no Rio Grande do Sul, fato que tende a contribuir com a retomada dos preços. “Esperamos também que o governo compre essa ideia e incentive o setor produtivo, com linhas de crédito e programas governamentais.”

A lei do Leite

Conforme o diretor executivo do Instituto Gaúcho do Leite, Orêno Ardêmio Heineck (65), a Assembleia Legislativa aprovou nesta terça-feira, dia 22, a “Lei do Leite.” A regulamentação visa aplicar todas as políticas públicas para exigir a produção de qualidade tanto na indústria, quanto na propriedade.

Heineck diz que essa medida fará com que, gradativamente, o leite produzido no Estado tenha seu prestígio retomado e o produtor – parte mais atingida na crise – consiga receber um preço justo pelo produto. “A Lei do Leite acabará com a fraude no setor, regulando a indústria, o transporte e a produção. Com isso, caminhamos para excelência no setor.”

Em reunião realizada nesta terça-feira, dia 22, os membros do IGL apresentaram ainda as estratégias para o ano de 2016, que deve ser marcado pelo investimento em pesquisa e inovação na área da produção.

Heineck conta que a ideia é firmar convênios com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), a Embrapa e a Fundação de Economia e Estatística (FEE), para ampliar a pesquisa. “Queremos também inserir o setor produtivo de leite gaúcho em ações federais, com foco na captação de recursos junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Agronegócio (Mapa).”

Ainda dentro das ações estratégicas do IGL está a criação de campanhas publicitárias para incentivar o consumo e valorizar o produto do Estado. “Neste quesito entra uma questão importante. Queremos implantar um selo de procedência e denominação de origem, para agregar valor aos produtos lácteos”, confirma o diretor executivo do IGL.

O IGL pretende investir também em diferentes áreas

  • Acompanhamento das exportações de lácteos, para os destinos abertos pelo Mapa, criando um banco de dados e um catálogo com os potenciais clientes estrangeiros;
  • Expansão do mercado interno na intenção de ampliar as compras institucionais e a implantação das diretrizes da Lei do Leite;
  • Conservar a aliança construída para manter a sanidade dos rebanhos combatendo a tuberculose e brucelose bovina;
  • Rastreabilidade do rebanho leiteiro;
  • Investir na capacitação da produção, transporte e indústria do leite;
  • Melhoramento genético para a expansão e eficiência da produção de leite.

Em questão

Em entrevista o secretário Estadual da Agricultura, Pecuária e Irrigação (Seapi), Ernani Polo (41), comenta a importância do leite na economia gaúcha e a forma como o governo pode melhorar as condições do homem do campo.

Em sua opinião, qual a importância do setor leiteiro para a economia gaúcha?
Ernani Polo – Muito grande! O Rio Grande do Sul é o segundo maior produtor no país e nos últimos dez anos foi o estado que mais cresceu em produção. A cadeia leiteira gaúcha é responsável por manter centenas de municípios gaúchos, que dependem do leite para movimentar a economia local. A renda de várias famílias, dependem da comercialização do leite, inclusive daquelas que trabalham no setor de laticínios.

Como a Seapi incentiva o setor e quais as políticas públicas mais se destacam?
Polo – Trabalhamos em diversas frentes. A fiscalização sanitária, seja na área de defesa ou de inspeção, está se qualificando e se estruturando nos últimos anos para atender as novas exigências e cenários. A questão do SISBI e do SUSAF é uma prioridade para nós, sabemos que precisamos oportunizar mercados além das esferas locais. Na parte de fomento, estamos com projetos integrados com outras entidades e órgãos do Estado que buscam trabalhar nos desafios em voga, são eles: a criação do Programa “Dia do Leite na escola” e o “Leite em Prática”.

Quanto a pasta investe na qualificação do produtor, de forma a elevar o nível da cadeia produtiva?
Polo – Desenvolvemos ações importantes. Os técnicos da secretaria da agricultura elaboraram, em conjunto com entidades, um Projeto de Lei já protocolado na Assembleia Legislativa, que visa regrar todo o processo que envolve o leite, do produtor ao consumidor, para garantir a qualidade do mesmo, evitando fraudes e preservando os bons produtores .Temos também o Leite em Prática, que visa levar estudantes concluintes de cursos na área de agrárias que irão trabalhar para melhorar a qualidade do leite de propriedades de baixa litragem, pretende-se em 2016 trabalhar com mais de cem propriedades, e capacitar 30 jovens formandos para atuar profissionalmente no campo.

CIC Vale do Taquari

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