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Jurandir acredita na ascensão da cultura (Foto: Roberta Ruffatto)

Erva-mate: Tradição a preço de ouro

Patrocínio

Aumento de mais de 100% no preço do produto em meio ano anima plantadores e assusta consumidores da bebida típica do gaúcho

Vale do Taquari – Está mais caro manter uma das maiores tradições do Estado. O valor da matéria-prima da bebida típica do gaúcho alça voos. Em seis meses o preço da arroba, paga ao produtor, subiu mais de 100%. Aumento que agrada os agricultores, mas que assusta o consumidor. O preço do pacote de erva-mate, nas prateleiras dos mercados de Arvorezinha, uma das cidades em que mais há produção no estado, a cada semana está maior.

Porém, especialistas acreditam que o valor tenha atingido o ápice e se estabilize a partir de agora. Atualmente, o produtor está recebendo até R$ 18 por arroba, quando o preço pago em meados do ano passado era R$ 8. Tendo em vista que a erva-mate passou cerca de cinco anos sem reajuste nos preços. Para o empresário do setor ervateiro, Jonas Dall”Agnol o que acontece com a erva-mate é a conhecida lei da oferta e procura. “Quando falta produto, aumenta o valor. O que acaba assustando é que foi um aumento alto em poucos meses, sendo que passamos anos com o preço estagnado”, observa.

Ele chama a atenção para a situação vivida na Argentina, onde o imposto pago na exportação cresceu e com isso as indústrias brasileiras, principalmente de chás, optaram por não comprar mais a produção do país vizinho. “E como no Brasil havia desvalorização, eles começaram a comprar produção local e isso fez com que faltasse produto nas ervateiras, e consequentemente o preço elevou”, analisa. Dall”Agnol também acredita que o valor tenha atingido o teto máximo. “Se aumentar mais vai fazer com que o consumo diminua, e com isso sobre produtos e o preço despenque novamente. Além disso, o mercado não tem condições de absorver tanto aumento”, afirma.

O empresário vê a alta nos preços como uma valorização do setor. “Há anos sofríamos com a desvalorização, vendendo pacote há R$ 2. Não tinha como repassar aumento ao produtor. Para ser justo, o pacote deveria estar custando R$ 10, não é caro se pensarmos que um quilo de erva-mate dura até dez dias para uma família. Se compararmos a outros alimentos, que também sofreram reajuste, como o tomate, a erva-mate não está cara”, aponta.

“Não adianta aumentar a produção, se não houver qualidade”

O aumento no preço da arroba fez com que muito produtor buscasse ampliar o número de pés de erva-mate. Os viveiros da região aumentaram a quantidade de mudas e já estão com todo o estoque vendido. Porém, o produtor Diego Baldissera, de São Roque, Ilópolis, acredita que plantar mais, em virtude do preço, não é a melhor solução. “Não adianta você aumentar a produção, se não houver qualidade. Não vai ganhar mais por isso. Hoje em dia só é valorizado o produtor que oferecer erva-mate de qualidade. Prefiro continuar com os 80 mil pés que tenho hoje, mas com qualidade”, afirma.

A erva-mate é atividade antiga na propriedade, ocupando uma área de aproximadamente 20 hectares, onde divide espaço com outras culturas, como o milho. Para ele, o preço pago pela arroba é o justo. “O problema é que aumentou muito em pouco tempo, este aumento deveria ter vindo ao longo dos anos, assim a atividade seria mais valorizada e a indústria e o consumidor não sentiriam o impacto”, observa. Há seis meses, Baldissera recebia R$ 7 pela arroba, hoje ele chega a ganhar R$ 16,30. “Vejo um setor que está caminhando bem, porém me preocupo quanto ao futuro, pois parece incerto. Tem muito para evoluir, ainda, mas a valorização do produtor já está começando”, destaca.

“Pode chegar a R$ 30 que continuarei comprando”

A aposentada Pierina Sabadin e a nora Luci, de Arvorezinha, não abrem mão de uma boa cuia de chimarrão. Seja de manhã ou ao final da tarde. Para elas é a companhia indispensável. “Desde que casei tenho este hábito. Levantava de manhã tomava meu chimarrão e depois ia fazer minhas tarefas. Antes de ficar viúva tinha a companhia do marido, mas mesmo depois que ele faleceu não larguei o chimarrão, continuo compartilhando com a família”, conta Pierina.

Luci é tão apaixonada quanto, e o aumento no preço não influenciou no consumo. “Pode chegar a R$ 30 que vou continuar comprando. Não largo meu chimarrão, e depois um pacote dura mais que uma semana, não se torna caro. Além disso, vejo a cuia como minha companheira e um passatempo. É tão bom quanto o marido e os filhos chegam do trabalho e você tem o chimarrão pronto esperando, é um momento de sentarmos e conversamos. Ele aproxima as famílias”, afirma.

Pierina destaca que este é o único vicio que possui. “E é saudável. Você pode tomar a qualquer hora que faz bem. Nem penso em largar. Quando você recebe uma visita a primeira coisa é preparar o chimarrão, isso faz parte da vida do gaúcho”, ressalta.

Entrevista

A reportagem conversou com o presidente do Polo Ervateiro do Alto do Vale do Taquari, Jurandir Marques, para que ele pudesse apresentar e analisar o cenário atual. Acompanhe.

Quais os fatores que causaram o aumento no preço da erva-mate?

A erva-mate estava muito baixa, merecia e precisava desta valorização. Há cinco anos o preço estava o mesmo. Muitos foram os fatores que contribuíram com o aumento, uma delas foram as estiagens em 2009 e 2010 que causaram perdas nos dois anos seguintes, chegou a afetar 25% da produção, comprometendo a qualidade e a produtividade. Outro ponto foi o uso de adubo químico em excesso, que intensificou a formação dos brotos e com isso vieram pragas, consequentemente queda de produtividade. Além disso, a mão de obra nas propriedades está escassa e ervateiras de outras regiões e estados buscam produção aqui, combinação que faz faltar erva-mate. Tudo isso fez com que houve ascensão e aumento de preço para o produtor, o que foi empurrando até chegar ao consumidor.

Quais as consequências que a estagnação no preço causou?

Ficamos cinco anos sem ter aumento, isso fez com que muito produtor se desestimulasse a cuidar do erval e priorizasse outras culturas. Eles não investiram em produtividade. Hoje é possível colher de 500 a 600 arrobas por hectare, mas podemos chegar, no mínimo, a 800 arrobas e isso agregaria valor na propriedade. Agora, com o aumentou o produtor voltou a se motivar.

Quais as orientações para os produtores?

Houve aumento significativo, sim, mas é preciso ter os pés no chão. Não podemos sonhar e achar que ganhando R$ 20 por arroba a cultura será sustentável. É preciso ter consciência que do outro lado tem o consumidor que não vai querer bancar essa conta. Como a erva-mate não é produto de primeira necessidade as pessoas podem abrir mão de comprar. Por isso, pedimos cautela, o momento é de organização e planejamento. O agricultor tem que avaliar a propriedade, se terá mão de obra pra colher, caso pense em aumentar a área. A melhor solução é plantar nas áreas que já possuem erva-mate. Também é preciso pensar na qualificação, em fazer sombreamento, adubação correta e ter mudas com boa procedência. A erva-mate você planta para a vida toda. Além disso, é importante que os produtores tenham fidelidade com a indústria que trabalham, que não salte de uma empresa para outra, querendo uma oportunidade que é passageira.

Quais as consequências do aumento no preço do produto?

Vejo como consequências positivas, desde que saibamos tirar proveito. É preciso ter planejamento e organização, olhando para futuro. É uma valorização merecida, estamos chegando ao que o produtor merece. Além disso, faz com que a região tenha um futuro promissor. A erva-mate é um alimento cheio de propriedades, que nos oferece além do chimarrão diversos outros produtos. Não consigo ver essa alta brusca no preço como uma crise e sim como um momento de ascensão da cultura, uma grande oportunidade. E a vinda do Ibramate para a região só fortalecerá a cadeia, mas precisamos saber usar isso. Saber aproveitar as oportunidades.

Vale a pena investir na cultura, ou é uma situação passageira?

Vale a pena investir sim, intensificar, fazer com que a área existente na propriedade possa produzir mais e melhor. Com isso teremos produtos com qualidade. Agora, se tiver um erval sem cuidados, o produtor não terá espaço no mercado. A chave é a qualificação do setor.

Como vê a cadeia produtiva?

Melhorou muito. Os produtores estão conscientes de que é preciso fazer sombreamento, fazer as etapas de manejo corretamente. Essa é a riqueza da propriedade. O setor está se organizando, e o nosso polo foi apontado pelo Sindimate como o que mais cresceu. Isso é fruto da organização da cadeia produtiva e de quem faz parte do processo. Mas ainda precisamos evoluir muito, há várias carências que precisam ser supridas.

Dados da região

O Vale do Taquari concentra 40% da produção de erva-mate do Estado. São cerca de cinco mil famílias envolvidas na atividade, o que resulta em 23,1 mil hectares. Em Arvorezinha e Ilópolis são os maiores produtores da região, juntas concentram mais de 12, 3 mil hectares. E a produção é absorvida por 27 indústrias instaladas nestes municípios.

CIC Vale do Taquari

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